domingo, 27 de junho de 2010

CAOS VERMELHO




Todos caminham como gladiadores que em poucos instantes terão que matar uma temida fera, ou talvez algo pior. Os rostos perdidos no meio da multidão parecem querer retornar ao lar, mas o dever e o destino lhes impõem uma longa caminhada, perigosa e incerta.


O campo de batalha não se parece em nada com os dos tempos antigos, já que ele até pode ser considerado moderno, porém, modernidade não é sinônimo de segurança e conforto. Esse lugar ao mesmo tempo temido, odiado e necessário é a linha vermelha do metrô de São Paulo.


Esse gigante que ajuda a cidade a funcionar tem a capacidade de transportar 60 mil passageiros por hora e espantosos 1,4 milhão por dia, fazendo a trajetória da zona leste à zona oeste da capital paulista. Curiosamente duas estações levam o nome de dois times de futebol, o Palmeiras e o Corinthians, que até na linha de metrô ficam em lados completamente opostos.


Os vagões, enormes estruturas de alumínio, percorrem ao todo 18 estações diversas vezes ao dia. Por dentro, o objeto de desejo dos passageiros são os bancos de plástico, duros e simples, mas sempre que se ouve o “PIIIIIIIII” que indica a abertura das portas uma guerra de cotoveladas e empurrões é iniciada apenas para tê-los.


A preferência é pelos bancos marrons, porque os azuis podem causar um efeito terrível em pessoas saudáveis; afinal, não é difícil se ver usuários sentados nos bancos azuis sofrerem de um sono devastador exatamente na hora em que entra algum idoso ou alguma grávida no vagão.


A trilha sonora dentro dos trens é bastante ampla e diferenciada; ouve-se desde um sertanejo de raiz até um funk carioca, e tudo isso graças ao companheirismo de usuários com fones de ouvido ultra potentes que praticamente transformam os vagões em baladas ambulantes.


Lugar tão democrático quanto o metrô talvez só as praias do Rio de Janeiro. Nas imensas estações encontramos empresários e ambulantes, bonitos e feios, cheirosos e não tão cheirosos, todos misturados e com um só objetivo, o de chegar ao destino esperado na hora certa. Um dos poucos mal vistos são os passageiros que insistem em querer ver a parte de baixo dos vagões, obrigando os “maquinistas” a dizerem a arrepiante frase: “estamos parados devido a usuário na via”.


Os estudantes que pretendem seguir uma carreira que exija conhecimentos de física também contam com uma contribuição considerável do metrô paulistano. Um dos bons
exemplos disso ocorre na estação Brás, onde uma das leis de Newton é totalmente desmoralizada, pois a partir dessa estação dois corpos passam a ocupar o mesmo lugar no espaço. Por sorte, a credibilidade de Newton não é totalmente perdida, já que na estação Sé sua primeira Lei se faz presente e é comprovada quando mesmo que o indivíduo não queira desembarcar ele acaba desembarcando por inércia, todos os dias entre seis e oito da manhã e cinco e nove da noite.


Como todo convívio em família, as relações entre passageiros são repletas de brigas e desentendimentos que, na maioria das vezes, são causadas por empurrões e por cavalheiros que tentam se aproveitar de damas indefesas e ingênuas frequentadoras dos corredores estreitos dos vagões. Essas discussões, estranhamente e comicamente, sempre terminam com a mesma frase: “se não está contente vai de táxi!”.


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